Marley

Tenho adiado escrever sobre o Marley e também não me atrevi a escrever este texto fora de casa. Ele morreu.
O Marley morreu. Tive vários dias em que esta frase não me entrava, simplesmente não entrava na minha cabeça.
Para começar nunca tinha feito luto, de nenhum tipo, perdi o meu avô era ainda muito nova, sem consciência do que realmente estava a acontecer e por outro lado não tive muitas vezes com ele.
Então dou por primeira perda o Marley, o meu cão. O meu primeiro cão, não podemos contar como primeiro animal de estimação aquele animal que quem toma conta é a tua mãe ou pai, assim que para mim ele foi o meu primeiro animal de estimação.
Para onde eu fosse ele ia, estivesse como estivesse sabia que ele estaria do meu lado. Foi daquelas amizades silenciosas e leais que nunca, nunca vou esquecer.
Antes de ele falecer tivemos ambos uma semana bastante complicada entre idas ao veterinário, injecções em casa e a minha esperança a desfalecer.
No dia que foi abatido eu já sabia, na noite anterior eu vi-o de tal maneira que quando ia a caminho do veterinário, eu já sabia.
Não existe maneira de descrever o que eu senti naquele chão, estou a tentar, estou a tentar explicar a quem lê e a mim que escrevo, tudo o que senti.
Mas não é fácil quando penso naquele dia e sinto no meu peito o último suspiro dele, quando ele respirou fundo pela última vez...
Ficou-me na memória de tal maneira que é como ter um flashback, eu tenho no meu coração o último suspiro dele.
É me muito complicado escrever sobre isto, verdade seja dita estou lavada em lágrimas enquanto os meus dedos tentam encontrar as palavras justas.
As duas primeiras semanas foram...não sei bem como foram, a sensação que tinha era que de repente eu era uma pessoa que não sentia, não sentia nada para além de tristeza.
Existem muitos textos a colocar o Luto/perda no mesmo patamar que uma depressão pois é de facto algo que nos coloca de imediato num estado de apatia descontrolada onde é muito complicado ter que lidar com a vida em geral, não queremos lidar de todo com o que quer que seja.
Só queria que ele estivesse aqui, pensei eu tantas vezes, tive pesadelos que nunca contei, adormeci com os últimos minutos no veterinário a aparecerem-me nitidamente na cabeça.
O Marley não me largava, era adorado por todos, era tão louco por mim como eu por ele, ter de me despedir dele para mim não fazia sentido, eu queria o Marley para sempre comigo, ele era o meu melhor amigo, ele estava sempre, nos meus melhores dias e nos meus piores dias.
O ser humano não consegue ser assim mutuamente, nós não conseguimos estar nos piores dias de outras pessoas, não sem julgar, não sem te cobrar algo. Aquele cão era o meu abrigo, o meu abraço e sem duvida o meu porto seguro.
Dizem que perder um animal de estimação é equivalente a perder alguém da família, claro que ainda existe muito preconceito em relação a isso, se fosse a perda de um familiar as pessoas à tua volta iriam ter na sua maioria uma compaixão diferente, quase como se entendessem aquele luto, aquela dor gigante. Com um animal entendem, apoiam mas apenas até determinado ponto e eu entendo, nem todos são habituados a ter animais ou foram criados com um. E a dor não pode ser medida, não sentimos todos igual nem lidamos todos da mesma maneira.

Sair de casa nos primeiros dias era algo que eu simplesmente não queria fazer, passei uns dias a comer sentimentos (literalmente) e fui amarga, sentia-me amarga e sem paciência. Zero paciência.
Via em todos os lugares um Marley, quando era um labrador preto o meu coração encolhia de tal maneira que pensei mesmo em ir buscar outro cão. Eu só queria que aquela dor atenuasse e ignorei os meus dois cães, ok que eles não são aquele tipo de cães que andam comigo pela casa como se não houvesse amanhã, mas eu também não os procurei. Rejeitei-os até. Rejeitei tudo.

Só queria o Marley de volta, de alguma maneira. De qualquer maneira.
A dor não passou, se falam nele ou mesmo eu, as lagrimas correm pelo meu rosto. O que mudou foi como eu reagia a isso, eventualmente teria de reagir, abanar-me e sair daquele mood. Não me fazia bem a mim nem a quem me rodeava. Penso que seja assim, temos uma fase mais dark em que nos deixamos ir até ao fim do poço para depois voltarmos a subir. A ideia de ter outro cão foi colocada de lado e finalmente comecei a dar atenção aos que ficaram. Penso que só na semana passada olhei realmente para a perda com olhos de ver, ainda muita emoção mas a minha vida não pode parar.
Por muito que eu deseje não voltarei a ver o Marley, por muito que eu queira ficar no fundo do poço eu simplesmente não posso. Dei a melhor vida que pude ao Marley, fui a melhor dona que consegui e amei-o tanto enquanto vivo que só posso olhar para trás e agradecer.
Eu tive um Marley do meu lado, não sei quando vai deixar de doer. E está tudo bem.
Temos de lidar de alguma maneira com a perda e eu vou lidando, gradualmente, com o facto de não o ter mais. Olho para as fotos dele e apesar de ainda ser recente, de ainda chorar por ele, já reajo.

Faz parte, o Marley morreu. Nunca mais o vou ver, tocar ou cheirar. Tenho de aceitar isso como se fosse a única certeza que tenho na vida, não posso parar porque nada do que eu possa fazer irá trazer o meu cão de volta.
Ele não está mais, ainda assim, amo-o como se estivesse.

Adeus Marley, um dia as tuas cinzas serão colocadas no seu devido lugar onde farás parte da Terra e onde parte de ti estará. Para sempre.

A tua sempre dona, Patrícia.




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